Câncer de Colo de Útero

 CÂNCER DE COLO DE ÚTERO

 

O câncer de colo do útero (a região final e estreita do útero que liga o útero à vagina),  também chamado de câncer cervical, é causado pela infecção persistente por alguns tipos de vírus (chamados oncogênicos) do Papilomavírus Humano - HPV, especialmente o HPV-16 e o HPV-18, responsáveis por cerca de 70% dos cânceres cervicais (WHO, 2010). 


A infecção pelo HPV é muito comum. Estima-se que cerca de 80% das mulheres sexualmente ativas irão adquirir ao longo de suas vidas. Na maioria das vezes, a infecção cervical pelo HPV é transitória e regride espontaneamente, entre seis meses a dois anos após a exposição (IARC, 2007). No pequeno número de casos nos quais a infecção persiste e, especialmente, é causada por um subtipo viral oncogênico, pode ocorrer o desenvolvimento de lesões precursoras (lesão intraepitelial escamosa de alto grau e adenocarcinoma in situ), cuja identificação e tratamento adequado previne a progressão para o câncer cervical invasivo (WHO, 2008). Esse período leva em média 15 anos, portanto, o adequado rastreio de lesões pré-malignas podem trazer grandes benefícios. Entretanto, em 10% dos casos, a progressão de in situ para câncer invasor pode ocorrer em menos de 1 ano.


Mundialmente, em 2020, ocorreram cerca de 604 mil casos novos, representando 6,5% de todos os tipos de câncer em mulheres. Já para o Brasil, o número estimado de casos novos é de 17.010 casos, para cada ano do triênio de 2023 a 2025. O câncer do colo do útero ocupa a sexta posição entre os tipos mais frequentes de câncer. No Brasil, em 2020, ocorreram 6.627 óbitos, e a taxa de mortalidade bruta por câncer do colo do útero foi de 6,12 mortes a cada 100 mil mulheres.


Na análise regional, o câncer do colo do útero é o segundo mais incidente nas Regiões Norte (20,48/100 mil) e Nordeste (17,59/100 mil) e o terceiro na Centro-Oeste (16,66/100 mil). Já na RegiãoRegião Sul (14,55/100 mil) ocupa a quarta posição e, na RegiãoRegião Sudeste (12,93/100 mil), a quinta posição (INCA, 2022).


Fatores de risco associados ao câncer de colo de útero:

  • Em primeiro lugar, infecção pelo HPV (um vírus que pode ser transmitido por relações sexuais, que infecta pele ou mucosas, podendo causar câncer de colo do útero e também de boca, faringe, vulva, vagina, pênis e canal anal),

Ilustração do vírus HPV

  • O tabagismo (mulheres fumantes têm duas vezes mais risco de ter câncer de colo do útero do que aquelas que não fumam),
  • A iniciação sexual precoce, 
  • A multiplicidade de parceiros sexuais e a multiparidade (múltiplas gestações) são considerados fatores de risco para o desenvolvimento de câncer do colo do útero (ICESCC, 2006; 2007; 2009). 
  • A idade também interfere nesse processo, sendo que a maioria das infecções por HPV em mulheres com menos de 30 anos regride espontaneamente, ao passo que acima dessa idade a persistência é mais frequente (IARC, 2007). A mortalidade aumenta progressivamente a partir da quarta década de vida.
  • Antecedentes de doenças sexualmente transmissíveis.
  • Imunossupressão.
  • Estímulo estrogênico endógeno e exógeno, como o uso de anticoncepcionais hormonais.

O câncer cervical é uma doença induzida por vírus causada pela integração do HPV de alto risco no genoma do hospedeiro. Sendo assim, o processo da carcinogênese está associado à expressão das proteínas oncogênicas virais E6 e E7. Essas proteínas são capazes de inativar os produtos proteicos dos genes supressores de tumor TP53 e Rb, o que induz uma proliferação celular continua com o risco crescente de acumulo de danos do DNA, que eventualmente evoluem para o câncer. E6 e E7 são essenciais para induzir e manter a transformação celular devido à sua interferência no controle do ciclo celular e apoptose (morte celular programada).


A instabilidade genômica causada pela integração do genoma viral ao do hospedeiro é essencial para a transformação neoplásica e com base nisso, foram desenvolvidas vacinas profiláticas contra o HPV, fazendo com que o câncer de colo de útero possa ser prevenido e erradicado.


Já a detecção precoce é feita por um exame conhecido como papanicolau, um procedimento simples que analisa amostras de células recolhidas do colo do útero por meio de raspagem com uma espátula e escovinha. O material é analisado em laboratório para o estudo anatomopatológico. O exame citopatológico é o método de rastreamento do câncer do colo do útero, indicado para a população alvo de 25 a 64 anos, a cada três anos, após dois exames anuais consecutivos normais (INCA, 2016; 2021). Mulheres expostas ao HIV ou com problemas no sistema imunológico devem fazer o exame anualmente. 



Há recomendações nacionais e internacionais com o uso de testes de detecção do HPV, associados à citologia vaginal (papanicolau), em mulheres com 30 anos ou mais. O teste de HPV é mais sensível e tem alto valor preditivo negativo, permitindo aumentar o intervalo entre as coletas, de três para cinco anos, quando ambos os exames forem negativos. 


O Ministério da Saúde incorporou ao Sistema Único de Saúde (SUS) um teste para detecção de HPV em mulheres. A tecnologia utiliza testagem molecular para detecção do vírus e o rastreamento do câncer do colo do útero. A portaria foi publicada dia (8) de março de 2024, no Diário Oficial da União.


A vacina contra o HPV foi introduzida no mundo desde 2006, com alta eficácia e segurança na prevenção de infecções e das doenças HPV induzidas. A imunização é distribuída gratuitamente pelo SUS e é indicada para meninas de 9 a 14 anos e meninos de 11 a 14 anos; também para um grupo especial, de pessoas que vivem com HIV, pessoas transplantadas de tumores sólidos ou de medula óssea e pacientes oncológicos (mulheres na faixa etária entre 9 e 45 anos e homens dos 9 aos 26 anos).


Atualmente no Brasil, existem vacinas licenciadas contra o HPV para prevenção do câncer cervical: Gardasil/Silgard (MSD, Sanofi Pauster, SNC/Merck Sharp & Dohme Ltd.), quadrivalente, e Cervarix (GSK Biológicas), bivalente. Ambas protegem contra o subtipo do HPV 16 e 18, que causam 70% dos cânceres de colo de útero, 80% dos casos de câncer de canal anal, 60% dos cânceres vaginais e 40%  dos cânceres de vulva. A quadrivalente, também protege dos subtipos HPV 6 e 11, que provocam 90 % das verrugas genitais.


Em 2014, foi aprovada nos EUA pela FDA (Food and Drug Administration), a vacina Gardasil 9 (Human Papillomavirus 9-valente Vaccine, recombinate) para a prevenção de doenças causadas por 9 subtipos de HPV - 16, 18, 31, 33, 45, 52, 58 (HPV de alto risco) e pelos HPV 6 e 11(baixo risco). A Anvisa aprovou no Brasil a Gardasil-9 desde 2017.


Mulheres grávidas não devem fazer o uso das vacinas contra o HPV devido a falta de estudos, sendo que se ja iniciado o esquema, deve ser feito as doses subsequentes após a gestação. A contraindicação absoluta ao uso da vacina são de pessoas que tenham hipersensibilidade grave aos princípios ativos dos excipientes da vacina. Deverá ser aplicada: 


– Meninas e meninos de 9 a 14 anos: duas doses, com seis meses de intervalo (0-6 meses); 

– A partir de 15 anos: três doses (0-2-6 meses); 

– Imunodeprimidos de 9 a 45 anos, independentemente da idade: três doses (0-2-6 meses).


Os principais tipos de câncer de colo do útero são o carcinoma espinocelular e o adenocarcinoma.

  • 70 a 80% dos cânceres de colo do útero são de carcinomas espinocelulares, CEC.
  • A maioria dos outros tipos de câncer de colo do útero são adenocarcinomas, em torno de 20-25% dos casos. Outras etiologias acometem cerca de 6% dos casos.
  • Com menos frequência estão os carcinomas adenoescamosos ou carcinomas mistos.
  • Outros tipos raros como melanoma, sarcoma e linfoma.

Os CEC são os mais comuns, sendo 8% sendo diagnosticados em fase metastática. O principal sitio de recorrência após tratamento primário é locorregional, topografia do colo de útero e/ou linfonodos pélvicos e para-aórticos. As metástases à distancia costumam comprometer ficado, ossos e pulmões.


Diagnóstico e Estadiamento oncológico:

  • Exame pélvico e história clínica detalhada: exame da vagina, colo do útero, útero, ovário e reto através de avaliação com espéculo, toque vaginal e toque retal.
  • Exame Preventivo Citopatológico(Papanicolau).
  • Teste de DNA-HPV e tratamento das lesões pré-cancerosas, coletado juntamente com o citopatológico.
  • Colposcopia – exame que permite visualizar a vagina e o colo de útero com um aparelho chamado colposcópio, capaz de detectar lesões anormais nessas regiões.
  • Biópsia – se células anormais são detectadas no exame preventivo (Papanicolau), é necessário realizar uma biópsia, com a retirada de pequena amostra de tecido para análise no microscópio.
  • Estudos Radiológicos: Enema baritado, Urografia excretora, Rx de tórax, Cintilografia, Tomografia de Abdome Total, RNM de pelve, USG, PET- CT podem ser necessários.


Após o diagnóstico e estadiamento do câncer, o médico especialista mostrará as opções de tratamento. A decisão por determinado tipo de tratamento leva em conta a idade da paciente, desejo de engravidar, estado de saúde geral e suas preferências pessoais.


O tratamento vai depender do estadiamento inicial e localização do tumor. As principais opções de tratamento para o câncer de colo do útero incluem cirurgia, radioterapia, quimioterapia, terapia alvo e imunoterapia, que podem ser realizadas isoladamente ou em combinação, dependendo do estágio da doença. 

  • Para os estágios iniciais do câncer de colo do útero, pode ser feita a cirurgia ou a radioterapia combinada com a quimioterapia. 
  • Para estágios localmente avançados, a radioterapia combinada com a quimioterapia é geralmente o principal tratamento. 
  • A quimioterapia isoladamente é indicada no tratamento do câncer de colo do útero avançado ou metastático.

Em função das opções de tratamento definidas para cada paciente, a equipe médica deverá ser formada por especialistas, como cirurgião oncológico e onco-ginecologistas, oncologista clínico e  radioterapeuta. E uma equipe multidisciplinar com enfermeiros, nutricionistas/ nutrologistas, fisioterapeutas, assistentes sociais, acupunturistas, psicólogos e cuidados paliativos.


O sucesso do tratamento é a avaliação e individualização caso a caso. Não se tratando o câncer apenas, e sim o indivíduo como um todo, com medos, anseios e desejos.


Agende uma consulta com seu médico especialista, faça rotinas de prevenção e mude os hábitos de vida.

Referências: 

- INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER JOSÉ ALENCAR GOMES DA SILVA. Estimativa 2020: incidência do Câncer no Brasil. Rio de Janeiro: INCA, 2019a. Disponível em: https://www.inca.gov.br/estimativa/taxas-ajustadas/neoplasia-maligna-da-mama-feminina-e-colo-do-utero (abre em nova janela). Acesso em: 12 maio 2021.

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- INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER JOSÉ ALENCAR GOMES DA SILVA (INCA). Atlas da mortalidade. Rio de Janeiro: INCA, 2020. Disponível em: https://www.inca.gov.br/app/mortalidade (abre em nova janela). Acesso em: 03 jun 2022.

- BRASIL. Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva. Coordenação de Prevenção e Vigilância. Divisão de Detecção Precoce e Apoio à Organização de Rede. Diretrizes brasileiras para o rastreamento do câncer do colo do útero. – 2. ed. rev. atual. – Rio de Janeiro: INCA, 2016. Disponível em: https://www.inca.gov.br/publicacoes/livros/diretrizes-brasileiras-para-o-rastreamento-do-cancer-do-colo-do-utero. Acesso em: 19 outubro 2021.

- INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER JOSÉ ALENCAR GOMES DA SILVA (INCA). Detecção precoce do câncer. – Rio de Janeiro: INCA, 2021. Disponível em: https://www.inca.gov.br/publicacoes/livros/deteccao-precoce-do-cancer. Acesso em: 19 outubro 2021.

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